Ventos do desterro

O texto de abertura do novo livro de contos de Decio Zylbersztajn, “Noites de argenta” (Ed. Reformatório), prepara o coração para recebermos as histórias de Irina, do Menino Aymara, de Filipa, entre outros desterrados, obrigados a deixar seu lugar de origem sob jugo das condições cada vez mais árduas deste mundo. Um tema mais que atual, visto que os refugiados somam, hoje, em torno de 115 milhões em todo o mundo. O autor é, ele mesmo, fruto de uma família do Leste Europeu que se deslocou para o Brasil no início do século XX em busca de melhores condições para viver. Leiam a entrevista com o escritor.

Os contos de “Noites de argenta” têm como fio condutor o drama dos refugiados, que, diferentemente dos imigrantes, são obrigados a deixar seu lugar de origem por motivos extremos. Por que esse tema lhe é tão caro?

R: Basta abrirmos os jornais e a resposta aparecerá. A cada dia nos deparamos com os dramas vividos pelos refugiados em cada canto do mundo.

A ideia de ligar cada um dos contos a um tipo de vento, considerando que os ventos são sinônimo de movimento, é original e boa. Como teve essa intuição?

R: Não sei dizer como surgiu a ideia da metáfora. Sei que me pareceu uma boa imagem do contraste entre liberdade e aprisionamento. Os desterrados, em geral, são pessoas com poucos ou nenhum direito, o que inclui o direito de ir e vir.

“Noites de argenta” é seu quinto livro. Os outros são: “Como são cativantes os jardins de Berlim” (contos, 2014) e “Acerba dor” (contos, 2017) e os romances “O filho de Osum” (romance, 2019) e “O arquivo dos mortos: histórias de um obituarista” (romance, 2022). Olhando para trás, como se sente com relação à obra construída?

R: Trata-se de um processo em construção. Cada livro está associado a um momento do autor e do mundo que o cerca. Olhando em retrospectiva, tem coisas que eu releio e aprecio, existem outras que eu não escreveria novamente. Não é assim com as nossas vidas? Sempre lembramos de atitudes que não faríamos da mesma maneira.

Você tem uma relação forte com a Islândia, país nórdico que visitou algumas vezes e para onde voltará em 2025. O que há de tão especial lá?

R: Acho que há o sentimento de que a Islândia não tem razões para existir, mas existe. A Islândia existe como resultado da persistência de um povo isolado submetido a condições adversas. O estereótipo do pequeno e frágil que sobrevive à intempérie. A leitura de Halldór Laxness (Nobel de Literatura de 1955) nos ajuda a compreender aquele povo.

Você mora em Gonçalves (MG), pequena cidade nas montanhas de Minas Gerais, não muito longe de São Paulo. Morar no campo ajuda a escrever melhor?

R: A escolha se relaciona à qualidade de vida. Talvez aqui eu tenha melhores condições para administrar o meu tempo, o que inclui a dedicação à leitura e escrita.

“Além da Letra” é uma festa literária organizada por você e por Marcelino Freire, em Gonçalves. Houve duas edições, haverá outras?

R: Espero que sim, mas eu não estarei à frente da curadoria. Tenho que fazer escolhas e decidi focalizar o meu tempo na escrita e na leitura. É hora de aprender a dizer não. Espero que as lideranças literárias de Gonçalves se motivem.

“Noites de argenta” teve lançamentos em São Paulo (SP), Cambuí (MG) e Gonçalves (MG). Quais são seus próximos passos neste ano e no próximo?

R: Até dezembro estarei em Campinas, na Livraria Candeeiro, e em Paraty na FLIP, na Casa Pagã organizada pelo editor Marcelo Nocelli. Além de passar por Extrema (MG) e Varginha (MG), cidades que fazem parte do Polígono Sul-Mineiro do Livro. Para 2025 estou organizando um encontro com leitores brasileiros em Amsterdã quando estiver a caminho do Book Festival de Reykjavik, Islândia, o melhor encontro literário que eu conheço.

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