Com elegância e fluência, e cada vez mais desenvoltura na construção de narrativas, personagens e diálogos que tangenciam o universo LGBTQIA+, o escritor Jorge Sá Earp – vencedor do Prêmio Nestlé de Literatura – presenteia os leitores com um novo livro de contos inéditos, “O veranista” (Ed. 7Letras). No conto-novela que dá título ao livro, o protagonista recebe dois hóspedes adolescentes para uma temporada em seu apartamento no Rio de Janeiro, e a convivência com os jovens desperta os desejos mais profundos. As histórias de Jorge Sá Earp são tão envolventes que parecem reais, nos deixando sem saber se é a vida que imita a arte ou se a arte imita a vida. Leiam a entrevista com o autor.
“O veranista” é seu vigésimo livro. Como se sente olhando tudo que realizou, como escritor, até hoje?
R: Vigésimo. Esse número redondo faz a gente refletir mesmo. Nunca pensei que fosse chegar a tanto. Ou não sei se pensei. As solicitações da imaginação chegam e vou escrevendo. Não planejo muito. A única coisa que planejei desde pequeno foi escrever a história familiar que me levou à trilogia “Os Descendentes”.
O novo livro expande o universo LGBTQIAP+ que já permeava livros anteriores de maneira, talvez, mais discreta. Os novos tempos favoreceram esta abertura?
R: O primeiro sobre o tema da homossexualidade que escrevi foi “O jogo dos gatos pardos”. Foi meu terceiro romance. Antes dele queria aprender a escrever. Por isso, fiz dois romances e contos com outros temas. Depois veio “Ponto de Fuga”, que também trata da homossexualidade. Ganhei o Prêmio Nestlé com Jorge Amado, Antonio Callado e Roberto Drummond no júri e aí me senti mais seguro a esse respeito.
Dentre os contos de “O veranista”, existe algum de que goste mais? Que seja o preferido ou que considere o melhor?
R: O que dá título ao livro e também “Um baile no Copa”. Não sei se são os melhores. Gosto pessoal.
Você é um escritor prolífico. Como decide que vai iniciar um novo livro? Ou escreve sem pensar até se dar conta de que tem material suficiente em mãos?
R: Geralmente me vem uma frase. E aí começo a ter uma ideia geral do enredo. Uma ideia vaga, muito vaga. A partir de então, vou ruminando a história, primeiro só em pensamentos para depois, aos poucos colocá-la no papel. Noutras vezes, o processo é inverso: me vem primeiro a ideia, o resumo da história, bem em estado de esboço, e, em seguida, a primeira frase. Os personagens vão surgindo aos poucos. Meu processo de criação é muito lento.
As vendas de livros, no Brasil e no mundo, vêm caindo vertiginosamente. Ainda vale a pena escrever?
R: Essa é uma pergunta que me faço com bastante frequência. E também é um assunto angustiante que troco com meus amigos escritores. Eles têm a mesma opinião que eu: o que nos move é uma ânsia estranha de criar, quase uma compulsão. Não nos importa saber se as vendas estão caindo. Deveríamos nos importar, eu sei, eles sabem, mas na realidade nosso prazer e nosso desejo de dar vida ao que está fervilhando nos porões de nosso inconsciente se revela mais forte.