Porta aberta para o inconsciente de um escritor

Juno, na mitologia romana, é a esposa de Júpiter e rainha dos deuses. O sexto mês do ano, junho, tem esse nome em sua homenagem. No romance de estreia do psicólogo Jonathas Justino, mestre e doutorando em Saúde Coletiva pela Unicamp/Campinas (SP), é o nome de um protagonista sem gênero definido, cuja maior ambição é enlouquecer. A razão desse desejo é se achar predestinado a trabalhar sem cessar, sem chance de mudar sua condição social. “Juno” se encontra disponível no site da Editora Letramento ou diretamente com o autor. Leiam a entrevista com ele.

Seu livro tem trechos fortes em que o inconsciente parece aflorar e que nos fazem lembrar a mitologia clássica ou as cartas do tarô. Como se deu a construção do romance?

R: Por vezes, sinto que o passado não foi superado, e acho que a memória — pessoal e coletiva —, diz muito sobre hoje, e talvez o mito que salta das páginas tenha a ver com isto. O “Juno” não teve um roteiro — começo, meio e fim — e, de certa maneira, parecia que o personagem ficava me “aguardando” continuar a escrita (parado na cena). Eu mesmo não sabia o final até as últimas páginas.

Por que a escolha de “Juno” para dar nome ao protagonista?

R: Dentre algumas, a razão principal é que este nome, Juno, pertenceu a uma pessoa muito importante pra mim. Um alguém que veio a falecer por motivos de exaustão do corpo, tendo o trabalho como ponto fundamental para seu óbito. Esse específico nome ficou comigo, e esta escolha — sinto eu —, torna-se uma forma de homenagem e uma necessidade de jamais esquecer esse trágico evento.

Ao falar de vigilância e liberdade, o romance tangencia questões filosóficas presentes na obra de Michel Foucault (1926-1984). Qual é a importância do pensamento de Foucault para você e como tratou de enxertar esses conceitos na trama?

R: Michel Foucault é um dos autores que mais me traz sentido em suas reflexões. Eu o leio sistematicamente. Sempre me perguntei, antes mesmo do contato com seu repertório: “o que fizemos de nós mesmos enquanto sociedade?”, e de certa maneira, consigo localizar minhas indignações em seus escritos ao refletir sobre nosso presente tempo.

Desde 2005 você trabalha com populações vulnerabilizadas, em situação de rua e/ou acolhidas em serviços de acolhimento institucional. Esse serviço contribuiu de alguma forma para a construção do seu livro?

R: A experiência relatada nesse livro é minha, mas não somente. Foram anos e anos junto à rua, às realidades difíceis, sempre muito próximo da violência (trago estas cenas comigo). Sonho com muita coisa — lembro de rostos e espaços um dia percorridos mas que tomam outras formas quando durmo. Os ambientes descritos no livro e até mesmo algumas das falas dos personagens foram escritos após eu acordar.

De onde veio “Juno” virão novos contos ou romances? Quais são seus planos como escritor?

R: Sim, estou na escrita da continuação de “Juno”. Penso que sua jornada deva ser transposta em uma trilogia. O Tempo é meu atual foco de análise e a pergunta que vem me movimentando é: poderia o tempo em seu universalismo de concepção, ser modificado por um cronificado cenário de violência?

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