A mecânica precisa da boa poesia

“A mecânica da palavra” (Ed. Penalux) é o oitavo livro de poesias de Alexandra Vieira de Almeida, mestre em Literatura Brasileira e doutora em Literatura Comparada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro – UERJ. Os versos revelam o completo domínio da autora sobre as ferramentas de que dispõe: as palavras. Leiam a entrevista com ela.

“A mecânica da palavra” (Ed. Penalux) mostra, mais uma vez, seu admirável domínio sobre matéria da poesia. Como se dá o percurso da sua escrita desde o “jorro” inicial até o poema completo, finalizado?

R: Há dois processos que se conectam durante a escrita e sua finalização. Primeiramente, utilizando uma dimensão que está no mundo clássico, a partir da ideia de Platão e que muitos poetas se referem, ocorre a inspiração. Depois do esboço do texto poético, uma primeira versão, vou mexendo, aparando, cortando, ou seja, trabalhando de forma mais consciente nele, em que um estado de inconsciência e consciência se intercambiam.

“Referências ao divino e ao sagrado estão presentes em todo o livro como uma de suas marcas mais fortes”, diz o escritor e professor da UFRJ, Leonardo Valente, na orelha do livro. Você é uma pessoa religiosa? Ou essas referências brotam naturalmente? Nesse caso, de onde vem?

R: Não sou uma pessoa religiosa, no sentido tradicional da palavra, me conecto com o sagrado diariamente. Posso me dizer mística, sem misticismos. Fui criada na igreja católica desde pequena, me batizando, fazendo a primeira comunhão e crisma, mas, na fase adulta, percorri um longo percurso, conhecendo diferentes religiões, estudando, sem rigidez, de forma comparativa, desde mais ou menos, os meus 20 anos, quando comecei a praticar Yoga Integral, de Sri Aurobindo. Hoje, após estudos in loco, sou uma pesquisadora mística independente, estudando em casa, a partir de livros e internet, tirando minhas próprias conclusões. Como disse um amigo, o caminho do sagrado é individual. Vem de algo que não consigo explicar racionalmente, por nossa lógica mais ocidental, parece que é algo que me surge como presente a partir de outras vidas, pois acredito em reencarnação.

“A mecânica da palavra” traz também uma extensa e rica fortuna crítica com trechos de resenhas e falas de importantes poetas contemporâneos sobre o seu trabalho. Como foi o processo de seleção desses textos? Por que a decisão de publicá-los?

R: Isto se deu a partir, inicialmente, no livro “A serenidade do zero” (Penalux, 2017). Fiz este percurso ao perceber que muitos escritores amigos também faziam suas fortunas críticas. Acho bem interessante para dar visibilidade ao seu trabalho e mostrar o reconhecimento alcançado ao longo do tempo. Em cada livro, nunca coloco um texto crítico que coloquei no livro anterior. Esse foi meu processo seletivo.

Você tem poesias publicadas na Revista Brasileira da Academia Brasileira de Letras, no Jornal Rascunho e em outros importantes veículos de divulgação de boa literatura no Brasil. Isso é suficiente para tornar um poeta reconhecido? Qual é o caminho para um poeta se tornar conhecido e respeitado no Brasil?

R: Acredito que isto seja uma parte de uma imensa engrenagem que evolui ao longo do tempo, da experiência e do amadurecimento. Prêmios são também muito importantes, mas penso que o maior reconhecimento para o escritor seja a recepção de bons leitores, ou seja, leitores que podem ser também autores e críticos literários. Por isso, dou grande importância à fortuna crítica, em que as pessoas que escreveram agiram de forma espontânea porque apreciaram os meus livros.

Em janeiro de 2023 você se tornará sócia do Pen Clube do Brasil, tradicional organização de escritores fundada em 1936 com a missão de defender a liberdade de expressão e os valores humanistas. O que significa para você essa honraria?

R: Para mim, participar do Pen Clube do Brasil será uma grande alegria e prestígio ao meu trabalho como escritora, pois na organização se encontram os maiores nomes da nossa literatura, tanto no domínio da criação literária quanto da crítica, pois há muitos professores do mundo acadêmico nessa instituição. Vai ser como um prêmio no meu currículo.

Mestre em Literatura Brasileira e doutora em Literatura Comparada pela UERJ, você se prepara para iniciar um pós-doutorado. Qual será o tema de sua pesquisa?

R: Sim, irei iniciar meu pós-doutorado neste mês de janeiro na UnB, com o professor supervisor polonês Henrik, que é especialista em literatura do Amazonas. A temática é sobre a especificidade da linguagem estética em quatro escritoras amazonenses no âmbito da prosa: Astrid Cabral, Elizabeth Azize, Sandra Godinho e Myriam Scotti, autoras de diferentes gerações e escritas muito diferenciadas. Durará um ano, de janeiro de 2023 até janeiro de 2024.

O que pretende, como escritora, daqui para a frente?

R: Pretendo divulgar minha literatura pelo Brasil, quando me for possível, e no exterior. Irei participar de congressos, seminários encontros literários. Escrevi durante a maior parte da minha vida poesia. Vou dar uma pausa, após uma intensa divulgação do novo livro, “A mecânica da palavra”, neste ano de 2023 e partir para a criação de livros em prosa: contos, crônicas, novelas e romances. E, quem sabe, mais adiante, uma peça de teatro. Vou me esforçar bastante para tanto e tenho já uma consultora literária, que está me orientando nestes novos gêneros. O mais importante é o próprio amor à literatura e a doação do que escrevo para os leitores, as chaves-mestras de meu percurso literário, sem eles, de que valeria escrever?

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