A pandemia do coronavírus trouxe muitas perdas e tristezas, mas, depois da chuva, coisas boas vieram à tona. Entre elas, o livro de estreia de Clarisse Escorel, neta de Antonio Candido, filha de um cineasta e de uma designer gráfica, editora e escritora, Ana Luisa Escorel, dona da Ouro sobre Azul. O gênero escolhido foi a crônica e os textos de Clarisse são como chuva de primavera, conforme atesta Ana Maria Machado, da Academia Brasileira de Letras, na apresentação: “(Clarisse tem) a necessária objetividade para mesclar sua inteligência aguda a uma sensibilidade aprimorada por sólida formação cultural”. Leiam a entrevista com a escritora.
O título, “Depois da chuva”, e a capa do seu livro, feita de cores alegres e estampa de flores, remete a vida que se renova após um período de imersão. Como a capa e o título dialogam com o conteúdo do livro?
Tanto o título quanto a capa, onde há flores, mas também há chuva e poças d’água, remetem à vida que se renova, à uma nova vida construída depois de uma tempestade metafórica. Aos dias de sol e céu azul pelos quais se anseia depois de um turbilhão. Além disso há uma crônica chamada As flores e, é claro, a crônica que dá título ao livro.
Você é filha de um cineasta e de uma designer gráfica, editora e escritora, e neta de um dos maiores pensadores da Literatura Brasileira, Antonio Candido (1918-2017), professor e crítico literário. O fato de ter nascido nessa família a influenciou a se tornar escritora?
É claro que nascer numa casa coberta de estantes, onde as conversas e hábitos giravam em torno da cultura, e onde pais e avós escreviam e liam e falavam sobre isso me influenciou, mas o impulso da escrita, me parece, independe disso e sempre esteve em mim. Me tornar escritora foi sempre um desejo candente, desde criança. Escrever sempre foi uma necessidade e uma forma de expressão com a qual me identifico.
Quais livros marcaram a sua vida de leitora e escritora? Como são suas leituras hoje? Como escolhe seus livros e como pauta a sequência (fila) que irá ler?
A lista é vasta. São muitos e com certeza vou deixar algum injustamente de fora. Mas vamos lá: As Brasas, O amor no tempo do cólera, A história do amor, Os maias, A Hora da estrela, Dois irmãos, as crônicas do Rubem Braga, Poeta chileno, Manual da faxineira, Pássaros na boca, tudo da Elena Ferrante. Ando obcecada com a Annie Ernaux e me encantei com o livro Meninas da Liudmila Ulítskaia. No topo da longa fila de espera estão: O que é meu e Escrever é muito perigoso. Muitas vezes leio mais de um livro ao mesmo tempo. Um de crônicas e um romance, um de contos e um romance. Escolho em função do que li a respeito do livro ou do autor, porque alguém me recomendou, porque o tema me interessou.
Por que escolheu o gênero ‘crônica’ para começar a publicar?
Sou fã incondicional do gênero. Tanto como leitora quanto como escritora.
Como é o seu momento de criação? De onde vem suas ideias e como as coloca ‘no papel’?
Minhas ideias surgem nas mais diversas situações e meu momento de criação começa aí, quando surge uma ideia e em seguida uma primeira elaboração dessa ideia, um rascunho mental. As ideias podem surgir da conversa da mesa ao lado no restaurante, de um diálogo com alguém na rua, de uma situação cotidiana qualquer, de um evento inesperado, de uma notícia de jornal, de lembranças. Anoto tudo, no bloco de notas do celular ou num moleskine que carrego comigo. Gosto de começar despejando as ideias “no papel” sem me preocupar, inicialmente, com a forma, de fazer o registro e, então, ir, aos poucos, lapidando. Deixar o texto descansar e ler em voz alta também são partes cruciais do processo.
Você foi aluna de professores e escritores consagrados como Luiz Antônio de Assis Brasil, autor do manual “Escrever ficção” (Companhia das Letras) e Fabrício Corsaletti em oficinas literárias. Como essa vivência influenciou sua escrita e a publicação do seu livro? Recomendaria oficinas literárias àqueles que desejam se tornar escritores?
Aprendi e aprendo muito com ambos. Teoria e prática. Não só a escrever melhor, mas a ler melhor. A ler como uma escritora, o que é totalmente diferente. São mestres queridos, generosos e muito admirados por mim. Essa vivência me trouxe uma disciplina essencial para a escrita. Recomendaria com certeza oficinas literárias para quem quer se tornar escritor.
Planeja escrever contos ou romances? Quais são seus planos?
Existe um livro de contos no forno e meu plano mais imediato é trabalhar nesse livro. As narrativas curtas me atraem bastante então gosto da ideia de trafegar entre a crônica e o conto. Tenho um projeto de romance mas ainda é cedo para falar sobre ele.