“Livro na borogodança” é uma nova incursão do escritor, professor e pesquisador transdisciplinar Nelson Job para cultivar um pensamento original brasileiro, uma vez que, a seu ver, a maioria de nossos filósofos, até hoje, estudaram, refletiram e comentaram a filosofia europeia. Assumir as potências das singularidades brasileiras, sem risco de se tornar ufanista, é a linha mestra deste novo trabalho do inquieto pesquisador transdisciplinar, doutor em História das Ciências, Técnicas e Epistemologia pela UFRJ (orientado pelo saudoso Luiz Pinguelli Rosa) e coeditor da revista virtual “Cosmos e Contexto” junto com o cosmólogo Mario Novello. Leiam a entrevista com o autor.
O que é borogodança?
R: A borogodança é um exercício de suscitar um pensamento e algo além do próprio pensamento a partir das singularidades brasileiras. Posto que a filosofia não ajuda muito nesse quesito, dada a preferência nacional em requentar o estrangeiro, fiz mais pororoca com a nossa literatura, música, artes plásticas, cinema, nossa maravilhosa e riquíssima mediunidade que é expressa de vários modos, entre outras inspirações.
Você transita entre a filosofia, a física e a cosmologia, e tem um acento pop em seus escritos, seja pelos temas que elege como pela forma de escrever. De onde vem essa rebeldia e como você se posiciona na academia?
R: Isso vem em focar a atenção o mais precisamente possível na vida, de modo que ela seja plena e ética. Para tanto, não basta fazer malabarismos conceituais, então é necessário, de um lado, realizar uma pesquisa transdisciplinar, envolvendo vários saberes, inclusive a arte e, de outro, estar atento ao que ocorre nas ruas, nas pulsações, às vezes discreta, da vida. A academia teve um papel importantíssimo para mim, permitindo experimentar a clínica, ser orientado por um físico espetacular, o Pinguelli, além de habitar um ambiente propício para investigação, descoberta e trocas. No entanto, a academia tem limites, normas, um tempo – que para mim é muito lento – para processar novas ideias e práticas. Por isso, fui gradativamente me distanciando, sem nunca deixar de fazer as devidas reverências.
Falta uma filosofia essencialmente brasileira, uma vez que nossos filósofos, até hoje, estudaram, refletiram e comentaram a filosofia europeia. “Livro na borogodança” seria a pedra fundamental de uma nova filosofia identificada com a nossa cultura?
R: Pode servir de inspiração, já que o livro mergulha em certa filosofia brasileira original, mostrando suas potências e insuficiências. Mas a borogodança vai além do pensamento, no sentido que há um conceito criado no livro para abandonar de vez os conceitos: o impensamental. Assim, apreendendo que os conceitos constituem a tessitura da filosofia, a borogodança estaria além da filosofia e de qualquer pensamento, até mesmo da espiritualidade, de certo modo. Desconfio que o Brasil, em suas mais profundas vísceras, não tenha tanta vocação para a filosofia – ao menos do modo que ela se desenvolveu ao longo dos séculos, desdobrando-se em ciência – mas para algo além, novo, provocador e fugidio.
Experiências místicas com ayahuasca, em rituais hindus, no carnaval carioca e até em um show dos Rolling Stones no Maracanã fazem parte da sua trajetória e são mencionadas no livro. Como essas vivências contribuíram para o seu trabalho?
R: Contribuíram intensamente, sendo parte indissociável da obra toda. Onde o pensamento é insuficiente, é preciso intuição. Onde até mesmo a intuição é insuficiente, é preciso uma desreferencialização radical, desdobrando-se em uma nova referencialização provisória, criando novos modos de viver. Para realizar tal tarefa com proficiência, experiências para além do racional são imprescindíveis, mas, claro, com muita prudência.
Em seu site, www.nelsonjob.com.br, você se autodenomina um “atrator”. O que é exatamente isso?
R: “Atrator” vem para dar conta da crítica do sujeito. Se não sou um sujeito “puro”, separado do cosmos, como definir isso para quem se refere a mim como “Nelson”? A melhor solução que encontrei foi um atrator de forças, de pulsações cósmicas, inspirado nos atratores estranhos da Teoria do Caos, mas “vórtex” também é um modo de autodenominação adequado. O atrator Nelson expressa um processo de “nelsar”.
O Curso na Borogodança (aula aberta dia 7 de maio, terça-feira, 19h às 21h) e a Imersão na Borogodança (27 de abril, sábado, 10h às 18h30) já estão disponíveis no site, sendo que o segundo é uma vivência, experimentação e meditação – tudo ao mesmo tempo agora. O que uma pessoa que optar por esses conteúdos pode esperar?
R: Na Imersão, teremos uma breve passagem pelos conteúdos do livro, com foco na (meta)desreferencialização e referencialização provisória, ou seja, a discussão teórica está a serviço do processo meditativo. Já o Curso, ainda que tenha lugar a meditação, está mais voltado para os conceitos e demais propostas teóricas do livro, mas lembrando que o principal conceito é o impensamental e o impensamental do livro é a borogodança.