Viagem ao centro de Rumah

Rumah (lar em malaio) é o livro de estreia do jornalista carioca Bruno Flores. Narra a saga do povo Kitaran no Pacífico Sul. Para escrever, o autor explorou os arquipélagos de Fiji, Tonga e Vanuatu por trinta dias. Com essa experiência riquíssima, Bruno fala sobre inspiração, lembranças de viagem e a saga presente em Rumah.

 

O que o instigou a contar uma história a princípio tão incompatível com a sua realidade de jornalista carioca?

 

A ideia surgiu com a leitura de dois capítulos do livro Colapso, de Jared Diamond: Crepúsculo em Páscoa (sobre o povo da Ilha de Páscoa) e As últimas pessoas vivas: ilhas de Pitcairn e Henderson. A partir de achados arqueológicos nessas ilhas, foi possível traçar a história dos povos que as habitaram num passado distante. Isto serviu de inspiração para a saga épica dos Kitaran. Rumah é idealizada como o paraíso perfeito, simboliza o desejo de todos nós de viver em paz e encontrar a felicidade.

 

O seu livro tomou forma após a viagem pelos arquipélagos de Fiji, Tonga e Vanuatu. Por que a escolha dessas localidades? Quais fatos marcaram a viagem?

 

A viagem proporcionou um contato direto com a natureza e, sobretudo, com os povos tradicionais dessas ilhas. Escolhi Vanuatu e Tonga, entre outras razões, por serem países com um turismo ainda incipiente. Fiji, embora tenha um turismo mais desenvolvido, entrou no meu roteiro devido à riqueza histórica e à natureza exuberante do lugar, sobretudo a ilha de Taveuni, ao norte. Fatos marcantes são muitos. Nadei com baleia jubarte em Tonga, visitei aldeias isoladas em Vanuatu e atravessei uma gruta de 300 metros de extensão com água nos joelhos. Tudo isso, de uma forma ou de outra, acabou se inserindo em Rumah.

 

O enredo entrecortado de Rumah, onde temos o passado, presente e futuro alternando-se é uma forma audaciosa de contar a história. O que o levou a adotar esse formato não linear?

 

Essa estrutura narrativa trabalha com a revelação de forma não linear, buscando no passado a compreensão para certos enigmas do presente. Assim, o livro começa retratando as gerações pós-colapso, em seguida o momento definitivo em que o destino de Rumah foi selado e por último a grande conquista, com a expedição que levou ao descobrimento de Rumah e à promessa da evolução dos Kitaran. As três histórias, embora separadas no tempo, relacionam-se entre si de diversas maneiras.

 

Quais livros complementaram o processo de escrita?

 

As obras de ficção Histórias dos mares do sul, de W. Somerset Maugham, A Ilha, de Aldous Huxley e O lobo do mar, de Jack London me ajudaram a encontrar o tom de aventura presente em Rumah, mas diversas obras auxiliaram no processo de pesquisa, com destaque para Os Polinésios, de Peter Bellwood.

 

A religião dos habitantes de Rumah, com Céu Pai, Terra Mãe e seus filhos, também são componentes que enriquecem a narrativa. Qual mitologia utilizou para construir as lendas do seu livro?

 

A mitologia que usei como referência foi a do povo Maori, da Nova Zelândia. Segundo ela, Céu e Terra viviam abraçados, mantendo aprisionados seus filhos, que um dia conseguiram se libertar para criar o universo. Essa crença tem um papel fundamental em todos os momentos decisivos do povo Kitaran, mesmo quando negada veementemente por alguns personagens, motivados por revolta. De certa forma, ela é a engrenagem da história.

 

Rumah também demonstra o renascimento de um povo. Dentro de você, existe algum paralelo entre Rumah e a nossa existência na Terra? Acredita que teremos a chance de um renascimento também? 

 

A saga de ascensão, queda e renovação dos Kitaran na ilha de Rumah, embora passada no cenário específico do Pacífico Sul, é universal. Guerras motivadas por questões territoriais ou ideológicas, devastação ambiental e consumo desenfreado de recursos são alguns temas do romance que sempre estiveram presentes na história da humanidade, até os dias atuais. O homem está em constante processo evolutivo e, claro, sempre há a possibilidade de um renascimento, desde que os erros do passado sirvam para iluminar novos caminhos.

 

-José Fontenele

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