Duas crianças, uma amizade e o extremismo da maior guerra da história. É este o cenário de Malditas fronteiras (ed. Benvirá), romance mais recente do escritor João Batista Melo e que conta a história dos amigos Sophie e Valentino – ela, menina alemã cega que mora com o pai e o avô; ele, garoto brasileiro filho único de um empresário xenófobo – às vésperas da Segunda Guerra Mundial na cidade de Belo Horizonte. Vencedor do Prêmio Nacional Cidade de Belo Horizonte em 2013 e finalista do Prêmio Benvirá de Literatura no mesmo ano, Malditas fronteiras será lançado nesta quinta-feira, 28 de agosto. Confira nosso bate-papo com o autor.
De onde veio a ideia para o romance?
Por volta de 1980 escrevi um roteiro de longa-metragem, junto com Alcino Leite Neto, que se passava em Belo Horizonte no início do século. Pesquisando para esse trabalho, li sobre um episódio que ficou gravado na minha memória. Durante a Primeira Guerra Mundial – assim como aconteceu na Segunda Guerra, de modo mais forte – houve algumas ações contra alemães que viviam no país. Numa delas, um grupo de estudantes acuou padres alemães que geriam um dos mais tradicionais colégios da cidade. No início do século XX, certamente havia em Belo Horizonte, como em Minas Gerais, uma religiosidade muito forte na sociedade. E chamou-me a atenção o fato de que algo suplantava esse “espírito religioso” do mineiro: o nacionalismo. Essa ideia ficou na minha cabeça até que, por volta do ano 2000, comecei a trabalhar em Malditas fronteiras, que chegou agora à publicação, quatorze anos depois da primeira linha.
Como você escolhe os temas dos seus livros? No caso de Malditas fronteiras, quais foram os desafios de escrever sobre um assunto já tão abordado como a Segunda Guerra?
Normalmente não escolho os temas. São ideias, fatos, impressões que vão crescendo no subconsciente até aparecerem já com uma cara de história. Foi mais ou menos isso que aconteceu com Malditas fronteiras. Eu não conhecia a história da imigração alemã, não tinha relacionamento com alemães, mas a história gradativamente ganhou força em minha mente até que eu fui obrigado a escrevê-la.
Realmente a Segunda Guerra já foi tema de muitas obras, embora nem tantas na literatura brasileira, mas para ser sincero eu nunca me preocupo com isso enquanto estou escrevendo meus trabalhos. Sempre que escolho uma temática, o meu objetivo é sempre falar daquele assunto com o meu estilo, com o meu olhar sobre o mundo. No caso do Malditas Fronteiras, minha preocupação maior foi tratar com equilíbrio temas como preconceito, discriminação, e a própria guerra.
Este romance foi vencedor do Prêmio Nacional Cidade de Belo Horizonte e finalista do Prêmio Benvirá – que inclusive resultou na sua publicação. Qual o peso, na sua visão, dos concursos literários na carreira de um escritor?
Concursos são muito importantes, em especial aqueles tradicionais e respeitados pela crítica e pelo mercado, pois trazem uma chancela de qualidade para o livro. Principalmente no Brasil, onde existem muitos textos a serem publicados, um número não muito grande de editoras interessadas em lançar literatura nacional e um público leitor que, embora tenha aumentado bastante, ainda não corresponde proporcionalmente ao tamanho da população brasileira.
No meu caso pessoal, concursos sempre tiveram um papel relevante, pois foi justamente a premiação que ajudou a viabilizar a publicação de vários dos meus livros. É claro que não é o único caminho para o autor, até porque os concursos estão cada vez mais concorridos, e o fato de não ser premiado não é nenhum demérito para a qualidade do texto. No Prêmio Benvirá havia 1500 concorrentes e no Cidade de Belo Horizonte, mais de 300. Certamente havia outros trabalhos excelentes, e que poderiam merecer o prêmio.
De qualquer modo, prêmios literários são uma iniciativa fundamental de incentivo à produção literária do país. Infelizmente, há no Brasil relativamente poucos concursos representativos. Na Espanha, por exemplo, existem dezenas, a maioria com premiação em dinheiro e publicação garantida através de uma editora comercial que lança e distribui o livro.
Por Carolina Drago