Lucas Figueiredo está entre os melhores jornalistas investigativos do Brasil. Autor de Morcegos negros, Ministério do silêncio, O operador, Olho por olho, Boa ventura! Seu livro mais recente é Lugar Nenhum – Militares e civis na ocultação dos documentos da ditadura, fruto do trabalho do jornalista enquanto membro da Comissão Nacional da Verdade (CNV), com missão de trazer à tona os arquivos secretos da Ditadura (1964-1985). Como o autor explica, o livro surgiu do resultado das pesquisas suas que não foram utilizadas no relatório final da CNV. Na entrevista abaixo, Figueiredo conta mais sobre a origem do livro e como o trabalho foi feito. Confira!
O material do seu livro foi fruto de sua pesquisa na Comissão Nacional da Verdade (CNV). A ideia do livro surgiu enquanto era membro da CNV ou depois?
Lucas Figueiredo.: Todo o material colhido na minha pesquisa para a CNV, incluindo documentos sigilosos produzidos por órgãos da repressão, todas as análises que fiz, tudo absolutamente foi entregue à Comissão Nacional da Verdade. Se a CNV tivesse divulgado o material, não haveria sentido de eu escrever o livro. Mas a CNV simplesmente não incluiu nada da pesquisa em seu relatório final. Logo meu livro se tornou uma necessidade. Afinal, não poderia concordar que as provas da ocultação dos arquivos da ditadura não viessem a público. Fui contratado pela CNV justamente para levantar esse material.
A CNV acabou, mas o seu livro aponta que uma importante parte da história do país ainda está escondida dentro das Forças Armadas. Qual a sua avaliação da Comissão Nacional da Verdade?
L.F.: O resultado final da CNV deixou a desejar. A comissão deixou de fora do relatório final não apenas os dados da pesquisa sobre ocultação dos arquivos da ditadura. Outras pesquisas importantes foram ignoradas no relatório final.
Em entrevistas sobre Lugar Nenhum, você comenta que houve uma destruição calculada de registros da ditadura militar. Qual foi sua dificuldade enquanto escritor para reunir os documentos para o livro?
L.F.: Obter os documentos sigilosos do tempo da ditadura é sempre um trabalho difícil. Existe uma dezena de jornalistas que faz esse trabalho já há algumas décadas. Alguns deles foram convidados pela CNV para tentar buscar esses documentos. Eu tive a honra de fazer parte desse grupo, que ficaria conhecida como equipe ninja, e de coordená-la. Os integrantes desse grupo têm fontes nas áreas militar e de inteligência. É o acesso a essas fontes que permite a obtenção dos documentos.
Após o lançamento de seu livro, houve algum desdobramento positivo com os leitores da obra que o surpreendeu?
L.F.: Tenho recebido muitas mensagens de leitores que se dizem surpresos não só com o resultado da pesquisa, mas também pelo fato de a CNV ter ignorado os dados em seu relatório final. Conseguir contar essa história me dá a sensação de dever cumprido.
Você está na Suíça há um ano e meio, tem planos para voltar ao Brasil ou não pensa nisso no momento?
L.F.: Meu momento atual é de movimento. A experiência na Suíça tem sido incrível e ainda tenho muito que ver por aqui. Volto para o Brasil, certamente, mas não tenho uma data. Por enquanto, meu desejo é de seguir andando.
– José Fontenele