Autora da bem-sucedida fábula de desenvolvimento pessoal Domingo, o jogo (2010), que permaneceu 33 semanas nas listas de mais vendidos em e-book dos jornais O Globo e Folha de S. Paulo, a escritora paranaense Cassia Cassitas acaba de estrear na ficção com o romance Fortuna, a saga da riqueza. O livro parte do episódio da crise imobiliária americana para refletir sobre o modo como o capitalismo e o dinheiro interferem na vida das pessoas, e até que ponto definem suas trajetórias. Nesta entrevista a Oasys Cultural, a autora revela suas pesquisas para construir a história, fala dos desafios de escrever sobre esse tema, avalia a repercussão positiva entre os leitores e adianta sua próxima obra, um romance que reflete sobre nossa busca pela felicidade.
Fortuna entremeia, basicamente, duas histórias – a de um economista que prevê a crise imobiliária de 2008 e a de uma família de imigrantes italianos que enriquece no Brasil ao longo dos anos. De onde veio a ideia para a trama?
O fascínio das pessoas pelo dinheiro foi meu ponto de partida. Qual o significado, a motivação, a importância da riqueza? Esse raciocínio me levou a uma pesquisa histórica sobre a relação entre humanidade e riqueza. A ideia de explorar a herança cultural que permeia nossas ambições surgiu quando pesquisei David Hume e Adam Smith.
Além disso, vejo semelhanças entre os desafios enfrentados pelos italianos no final do século 19 e pelos americanos deste início de século. A desapropriação da própria casa tem um efeito devastador que, na ficção, é vivenciada por Manolo e Carola. O desespero transformado em luta é a grande herança, o elo que liga as gerações de Fortuna da miséria à riqueza, de Manolo a Ricardo, de Ana à Carolina.
Suas áreas de atuação profissional são, em tese, engenharia, didática e filosofia. Quando a economia entrou na sua vida? E a literatura?
Sempre gostei de brincar com números, ouvir as conversas dos adultos. Certa vez, um consultor da IBM comentou como a empresa geria suas sedes, adquirindo e vendendo propriedades após determinada quantia de anos. Pesquisei o valor dos imóveis na época da aquisição da sede de Curitiba e o valor atualizado: comparei com a valorização de outros investimentos e fiz projeções de valorização futuras. Acho importante as pessoas conhecerem as regras básicas que nos levam a acumular o dinheiro e impedir que ele apenas passe por nossas mãos.
Os livros contribuíram muito com este aprendizado. Num tempo em que não havia internet, as obras da biblioteca municipal da cidade de 50 mil habitantes em que morava me abriram as janelas para um mundo maior. Para um leitor interessado, um livro deixa de ser um livro para se tornar um caminho de busca de alternativas. E escrever é discutir, expor pensamentos e propor outras perspectivas. Posterguei minha vontade de compartilhar ideias desde a adolescência até que, agora, com filhos crescidos e a vida prática resolvida, decidi ir em frente.
A economia costuma ser vista como um tema duro, que nem todos têm disposição para entender. Qual foi o maior desafio de escrever um romance cujas bases são a economia e seus conceitos?
Eu me empenhei em mostrar, na ficção, como a economia está presente na vida das famílias, dos profissionais, dos governantes, com naturalidade, através de “personagens emocionantemente reais”, como escreveu um leitor.
O personagem Ricardo, por exemplo, estuda o comportamento do mercado e argumenta sobre os limites da liberdade de mercado com sua esposa que não entende nada de economia. Através de exemplos e fatos, numa linguagem quase isenta de jargões e teorias econômicas, ele se esforça para fazê-la compreender, entre outras questões, as consequências financeiras e sociais de certas estratégias de enriquecimento rápido.
Fortuna também está traduzido para o inglês, com repercussão superpositiva entre os leitores americanos. Os comentários a surpreenderam?
Acho fantástica essa habilidade do americano de dar sua opinião sobre tudo. Os detalhes da realidade brasileira geram admiração e motivam comentários, apesar do pouco que a maioria dos americanos sabe sobre nossa cultura e história recente. Os leitores consideram os personagens muito reais e as tramas universais.
E o que dizer quando um leitor se diz “hipnotizado pela história desde o início”, afirma que o livro é “um dos melhores romances históricos” que já leu, ou cita o “sucesso da abordagem da autora”, comentando como Sallinger e Scott Fitzgerald tratariam o mesmo tema?
Enfim, meu propósito era lidar com temas difíceis de forma compreensível a não especialistas e que todos, ao lerem esse ou aquele aspecto, parassem e pensassem a respeito. As resenhas me dizem que isso está acontecendo e isso é muito gratificante.
Domingo, o jogo reflete sobre a família como pilar para o sucesso, Fortuna, sobre enriquecimento profissional e pessoal, e seu próximo livro terá como foco nossa busca pela felicidade. Que mensagem espera trazer com ele?
Família, dinheiro e felicidade? Se fosse uma trilogia, só poderia se chamar Vida! Domingo, o jogo é uma fábula de desenvolvimento pessoal em que o leitor é o personagem principal em treinamento, desde o berço até adquirir consistência, para alçar voo e fazer seu mundo. Em Fortuna, a saga da riqueza, os personagens estão no mundo, vão da indigência nas ruas da Itália ao suntuoso apartamento de elevador panorâmico em São Paulo. No romance previsto para 2014, os personagens conhecem seus lugares num mundo em que as riquezas lhe são acessíveis e a batalha é outra. Pelos olhos de André, o leitor vai adentrar numa atmosfera transformadora que surpreenderá, eu aposto, até o mais atento observador.
Por Carolina Drago