“O Livro do Verso Vivo” é a primeira antologia de ecopoesia em língua portuguesa, organizada por Mauricio Vieira e Thássio Ferreira e publicada pela editora Outra Margem. Conta com a colaboração de 46 poetas de Brasil, Portugal, Angola, Moçambique e São Tomé e Príncipe. Nomes conhecidos como Adriana Lisboa, Maria Esther Maciel, Mariana Ianelli, Nicolas Behr, Salgado Maranhão, e também outras e outros que despontam na Lusofonia. As ilustrações da artista visual Tikmu’un (Maxakali) Jé Hãmãgãy refletem o espírito da publicação. Leiam a entrevista com os organizadores.
Maurício vive na Europa e Thássio no Rio de Janeiro. Como vocês se conheceram e como surgiu a ideia da antologia?
Maurício: Foi uma agradável surpresa quando Thássio me escreveu. Havia descoberto a revista Arvoressências, da qual sou editor, algo incomum, pois faço pouca divulgação da mesma. A poesia e seu confluir com o mundo natural nos uniu. Pensei logo em Thássio quando comecei a elaborar a ideia da antologia, por sua sensibilidade ímpar sobre o tema.
Thássio: Li sobre a revista Arvoressências, editada pelo Mauricio com grande cuidado editorial e visual, e lhe enviei alguns poemas. Ele gostou dos textos e desde então mantemos trocas poéticas diversas.
O que é Ecopoesia? O nome é novo, mas a natureza sempre foi inspiração para os poetas. Manoel de Barros, por exemplo, fazia ecopoesia?
Maurício: Para ser bem sucinto, diria que ecopoesia é poesia sobre o vivo, pelo vivo, e para o vivo em nós. Agora, afirmar que a poesia de Manoel de Barros é ecopoesia talvez seja algo que só ele pudesse responder.
Thássio: Eu diria que ecopoesia é aquela atravessada por uma busca de construir no âmbito da linguagem poética uma relação menos hierarquizada do humano com outras formas de vida.
As poesias e prosas poéticas de “O Livro do Verso Vivo” nem sempre falam diretamente sobre a natureza. Como foi o processo de seleção dos textos para compor a coletânea?
Maurício: É verdade que utilizamos o termo ecopoesia no seu sentido amplo, para dar espaço a expressões que de alguma forma comunicam-se com o vivo, mas nem sempre diretamente. O processo de seleção ocorreu num ritmo orgânico, próprio do tema, tentando conciliar os textos pela ótica das seções Prece, Chama e Árvore.
Thássio: A partir do conceito transmitido às pessoas convidadas para a obra, cada uma delas teve ampla liberdade em nos enviar os textos que desejassem. A seleção a partir daí se deu mais no intuito de não tornar o livro muito extenso.
O livro tem ilustrações da artista indígena Jé Hãmãgãy. Como ela foi incorporada ao projeto? O que o fato de ela ser indígena significa e traz, como valor, para o “O Livro do Verso Vivo”?
Maurício: O Livro do Verso Vivo celebra e valoriza culturas indígenas, por interagirem com outros seres de forma respeitosa e ritualística. Estes rituais têm forte ligação com a poesia. Era preciso uma identidade visual para a antologia que captasse esta relação de rituais praticados por culturas indígenas com o dizer poético. Após uma breve pesquisa chegamos ao impactante trabalho de Jé.
Thássio: Uma das poetas do livro, Jamille Anahata, também indígena, nos sugeriu alguns nomes, e o trabalho da Jé nos chamou atenção pelo estilo que nos pareceu se entrosar muito bem com os poemas.
Todo escritor e escritora brasileiros sabem que é difícil vender livros no Brasil, ainda mais de poesia. O que esperam desse livro? Além nos lançamento no Rio de Janeiro, por onde mais ele andará?
Maurício: Independentemente de questões de mercado, percebi que era importante reunir a produção poética lusófona atual e recente relacionada ao vivo. O Livro do Verso Vivo agora fará seu percurso pelas letras lusófonas. Inaugura em setembro o festival Poesia um Dia em Portugal, com a participação de alguns dos poetas da antologia, como Margarida Vale de Gato, e seguramente ainda será alvo de outras manifestações literárias. O livro também poderá ser estudado no meio acadêmico, dada a temática, que presta-se a abordagens ecocríticas.
Thássio: Mais importante que vendas, estritamente, é que o livro circule, alcance sensibilidades e desdobre caminhos artísticos. Pretendemos fazer um lançamento em São Paulo em outubro, e levar a antologia a bibliotecas e centros culturais dispostos a recebê-la e dialogar com a obra, através de leituras, eventos e outras possibilidades.