Escritora, tradutora, professora universitária e radialista, Margarida Patriota lançou, em 2019, dois novos livros: o romance “Cárcere privado” (7Letras) e o volume de poesias “Tempo de delação” (Ibis Libris). Mestre e doutora em Literatura Francesa, lecionou por 28 anos Teoria da Literatura, Literatura Brasileira e Literatura Francesa no Departamento de Letras da Universidade de Brasília (UnB). Recebeu o Prêmio João de Barro (2006) pelo juvenil “Uma voz do outro mundo” e levou o Prêmio Ganymedes José de Literatura Juvenil da União Brasileira dos Escritores (UBE) (2011) pelo romance “Enquanto aurora”. Leiam a entrevista com a autora.
Em 2019, você lançou dois livros: o romance “Cárcere privado” e o volume de poesias “Tempo de delação”. Foi uma coincidência ou planejado?
R: Foi mais coincidência do que planejamento. Fui escrevendo prosa e poesia, meio alternadamente, meio simultaneamente, e, de repente, vi-me às voltas com um romance e um livro de poemas prontos, quase ao mesmo tempo.
“Cárcere privado” se passa em Brasília e expõe de modo irônico a realidade da capital do nosso país. Você nasceu em Brasília? Também vive essa realidade?
R: Nasci no Rio de Janeiro, morei muitos anos no exterior e cheguei ao DF em 1976, para ser professora da Universidade de Brasília. Comecei a trabalhar no regime da CLT, e, em 1990, os professores das universidades federais passaram a integrar o funcionalismo público. A região do Plano Piloto, onde moro e mora minha protagonista, abriga boa parte dos funcionários públicos da Capital. Meu apartamento tem quatro quartos e guarita com porteiro, tal como o da narradora do meu “thriller” brasiliense. Do ponto de vista social, nossa realidade é a mesma.
“Tempo de delação” – este título pode ser confundido com o conturbado momento da política brasileira, em que a delação premiada teve – e ainda tem – papel preponderante. Por que esse título para um livro de poesias?
R:Porque é próprio do poeta flagrar e revelar, arejando as palavras. Tempo de delação, além de ser o das delações colhidas na delegacia ou pela mídia, é o tempo da poesia. Delação significa tanto denúncia e acusação quanto revelação, funções que a poesia sempre exerceu. Fernando Pessoa denuncia o poeta, quando diz que este “é um fingidor, finge tão completamente, que finge até que é dor a dor que deveras sente.” Baudelaire denuncia o leitor, quando o chama de “hipócrita”. Drummond revela que “no meio do caminho tinha uma pedra”. Para Baudelaire, é função do poeta revelar o segredo das flores e das coisas mudas. Em Tempo de delação, conto que flagrei a noite atropelando o dia, pelotões de nuvens ladras a assaltarem o luar, ou como descobri que um musicista furtava o canto das sereias. Que coisas pedem para ser reveladas? Tudo, o visível e o invisível. Um pôr de sol, uma tristeza, uma parede, um comercial de sabão em pó.
Você é convidada para muitos eventos e atividades ligadas à literatura para crianças na capital federal, devido aos livros que já escreveu para o público juvnil, alguns deles premiados. Acredita que, atualmente, com tantos estímulos e apelos audiovisuais, ainda é possível formar leitores entre as crianças?
R: O livro, como bom rei que foi, e continua sendo, não perderá a majestade. As crianças que têm contato com o livro são sensíveis à aura que encerra e ao prazer que proporciona.
Após lançar dois livros de uma vez, como se sente? Quais são seus planos? O próximo livro será romance, conto ou poesia?
R: No momento, esvaziei minhas gavetas de material pronto para publicação, não sei o que virá pela frente. Sinto que a poesia me convoca, e embora queira dar-me um tempo só para ler, reler e devanear, prevejo que logo estarei às voltas com a criação poética.