Procuramos novos ângulos para coisas fixas, diz Roberta Lahmeyer em seu novo livro de poesia, Retas Oblíquas (Ibis Libris). Nesta segunda obra – a primeira foi Singularidade (Ibis Libris, 2013) – a autora aprofunda questões como forma-conteúdo, linguagem, pensamento, síntese e visualidade, dialogando de maneira transversal com a filosofia, a poesia concreta, neo-concreta e também com as artes visuais. Lançamento terça-feira, 8, às 19h, na Livraria da Travessa, em Ipanema.
Seus poemas falam de temas bastante metafísicos e um deles, no livro Singularidade (Ibis Libris, 2013) – que forma um díptico com o lançamento atual, Retas oblíquas – menciona Deus. Você tem algum tipo de religiosidade?
Interessante a sua leitura. E o mais importante é isto: tudo começa num ponto e depois cada leitura avança em uma nova direção. Podemos dizer que alguns poemas são metafísicos no sentido de terem um caráter mais abstrato. Mas eu os vejo por um ângulo oposto, que é precisamente o da desconstrução da metafísica, quando essa se apresenta como um pensamento totalizante que pretende conter alguma verdade absoluta sobre a existência. Nesse sentido, o surgimento da palavra Deus em dois poemas nada tem de religioso ou dogmático, trata-se de linguagem poética. No primeiro poema ao qual você se refere, que está no livro Singularidade, eu falo da estranheza de estarmos sobre uma bola girando no ar sem sabermos porque ou até quando. E no poema que está no atual Retas Oblíquas pergunto quem terá esculpido essa infinidade de galáxias, que vemos através de satélites e telescópios. Em síntese, o que parece-me movimentar os dois livros é o fato de ainda não termos respostas definitivas para questões essenciais, apesar de todos as evoluções científicas e tecnológicas que reconhecemos neste começo de século XXI.
A apresentação da poeta Celina Portocarrero, também em Singularidade, fala de ‘cadernos fechados (…) gavetas de acanhamento e livros relidos’. Como foi a trajetória da poeta Roberta Lahmeyer desde esse escrever acanhado até a publicação de seus dois livros?
Foram alguns anos de leitura e de escrita em silêncio. Um tempo fundamental para eu perceber a profundidade da minha relação com esses dois campos de força, leitura-escrita, e o quanto eles estão interligados. Nessa perspectiva, publicar vem a ser a consequência desse processo que continua a acontecer.
Retas oblíquas é um livro mais maduro em que a grafia dos poemas sobressai e integra a própria poesia, flertando com as artes plásticas. Quais são suas influências no mundo da arte? Quais artistas influenciam a sua escrita?
O título deste livro pode ter várias leituras, uma delas é que as retas oblíquas permitem interseções e nesse sentido multiplicam as possibilidades. Não são como as retas horizontais, por exemplo, que permanecem paralelas: uma reta poesia, outra arte visual, outra filosofia e etc. As retas oblíquas por sua inclinação natural atravessam e são atravessadas por diferentes forças. E de fato neste livro eu intensifico o diálogo com as artes visuais, num caminho talvez inverso ao da poesia neoconcreta, que levou o poema para fora do livro. O que eu tento é trazer elementos das artes visuais para dentro do livro. Há um poema-instalação, há poemas que convidam à interatividade e há também poemas ready-made. E esses últimos fazem referência ao Marcel Duchamp, que é um dos artistas que de forma transversal influencia a minha escrita.
Percebe-se que a poeta Roberta Lahmeyer sabe muito bem por onde anda e o que deseja realizar. Quais fontes, além das artes plásticas, alimentam seu caminhar? Já vislumbra outros livros ou criações?
A principal é a leitura. E sim, há outro livro sendo trabalhado e foi quando comecei a escrevê-lo, que percebi que os dois primeiros, Singularidade e o atual Retas Oblíquas, formam um díptico. O terceiro é diferente deles, está ainda no campo da poesia, mas já caminha em direção a uma forma mais narrativa. Não há, portanto, pontos fixos de criação.
– Valéria Martins